segunda-feira, 13 de outubro de 2008

A riqueza da diversidade

Há um provérbio africano, destes que existem em várias culturas, que diz “vai sozinho se quiseres ir depressa; mas se pretenderes ir longe, então busca companhia!” É fácil intuir como é verdadeira a sabedoria que encerra, quando nos recordamos dos momentos e experiências mais significativas da nossa vida, e de como tantos deles – a maioria? – os vivemos acompanhados. Mas também é fácil perceber como o mundo hoje tende a puxar-nos na outra direcção, no seguir o impulso quase instintivo à autonomia e independência em relação aos outros, do “eu sozinho sou capaz” e do “não preciso de ninguém”.
Por um lado não se pode negar, é verdade, a necessidade de cada um crescer no auto-conhecimento e na auto-confiança em relação às próprias capacidades: às vezes encontramos gente que vive vidas “apagadas” ou mesmo temerosas, e pensamos no quão diferentes poderiam ser se confiassem mais em si próprias, se fossem capazes de olhar-se de outra forma. Mas por outro lado o individualismo de hoje parece surgir muitas vezes não como caminho de crescimento, mas como caminho de fuga ao desafio que a convivência e o trabalho em conjunto implicam. Porque não é fácil crescer na arte do diálogo e da partilha, na destreza de pôr em palavras a nossa visão das coisas e de aceitar que o outro as veja de forma diversa. É difícil a arte da escuta autêntica, de tentar “meter-me nos sapatos do outro” para perceber o quê e porque está a dizer o que diz. Difícil é ainda a capacidade de criticar construtivamente, e de dispor-se a ouvir críticas também: tantas vezes “dispara” em nós a reacção de nos sentirmos ofendidos, “pessoalizando” a questão, e esse centrar-se na forma acaba por ser um quase-inconsciente afastamento do conteúdo do que está a ser debatido, porque isso resultaria incómodo.
Nesta linha, o crescimento parece ligar-se à capacidade de construir com outros não só nos momentos de sintonia mas também nas ocasiões de divergência. Capacidade de cada um se colocar numa atitude construtiva, e de acreditar e de agir no pressuposto de que os outros também assim estão. É conhecido aquele aforismo que diz que “a minha liberdade acaba onde começa a do outro”. Mas menos conhecido, e talvez não menos verdadeiro, é o facto de que “a minha liberdade começa onde começa a do outro”. Porque duas liberdades bem colocadas potenciam-se uma à outra, ajudam-se mutuamente a crescer naquilo que cada uma tem de melhor, para o bem das duas e de todos. O “amor” a que Jesus nos desafia passa no fundo por aqui, é o empenho na relação que se quer sólida e independente do facto dos ventos serem a favor ou contra.
Surge este editorial na sequência da “assembleia Essejota” que tivemos este Verão. Projecto alimentado num encontro informal entre vários jesuítas mais novos há cerca de um ano, desde o início foi claro que queríamos que fosse um “projecto de todos”. E não só de jesuítas, mas também de muitos amigos leigos que quisessem “fazer parte do barco”. Dividimo-nos por secções temáticas segundo os interesses de cada um, arranjou-se uma equipa de coordenação, e no Natal estava on-line uma “versão 0”, para ser comentada e discutida entre todos. Depois de muitos mails e conversas, sugestões e críticas, mudanças nos conteúdos e no visual gráfico, em Março tínhamos o começo das edições “à séria”. E neste Verão – única altura em que se consegue juntar gente vinda desde Boston a Roma, passando por Lisboa, Madrid e Braga - tivemos a primeira “assembleia” do Essejota.Net, com a presença de mais de metade dos cerca de 40 membros da equipa. Para muitos foi a primeira ocasião para se verem cara-a-cara, e houve espaço para partilhar comentários e criticas, discutir critérios e linhas de rumo, propor alterações e novidades (prometidas para breve!). Ficou a impressão da diversidade de visões das pessoas que constitui a “equipa Essejota”. Mas também a convicção da riqueza que essa diversidade posta em comum significa, e o desejo – como diz o provérbio – de assim juntos continuar o caminho.
Filipe Martins

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