Crer na divindade de Cristo
Mateus 16, 13-20
Mateus 16, 13-20
Pe. Raniero Cantalamessa, OFM
E vós, quem dizeis que eu sou?
Existe, na cultura e na sociedade de hoje, um fato que pode nos introduzir na compreensão do Evangelho deste domingo, e é a pesquisa de opinião. Ela é praticada em todos os âmbitos, mas sobretudo no político e comercial. Também Jesus um dia quis fazer uma pesquisa de opinião, mas com fins, como veremos, muito diferentes: não políticos, mas educativos. Chegado à região da Cesaréia de Filipo, ou seja, a região mais ao norte de Israel, em uma pausa de tranqüilidade, na qual estava a sós com os apóstolos, Jesus lhes dirigiu, a queima-roupa, a pergunta: «Quem dizem os homens ser filho do Homem?».
É como se os apóstolos não esperassem outra coisa para poder finalmente falar sobre todas as vozes que circulavam a propósito dele. Respondem: «Uns afirmam que é João Batista, outros que é Elias, outros, ainda, que é Jeremias ou um dos profetas». Mas para Jesus não interessava medir o nível de sua popularidade ou seu índice de simpatia entre o povo. Seu propósito era bem diferente. Então Ele lhes pergunta: «E vós, quem dizeis que eu sou?».
Esta segunda pergunta, inesperada, deixa-os desconcertados. Entrecruzam-se silêncio e olhares. Se na primeira pergunta se lê que os apóstolos responderam todos juntos, em coro, esta vez o verbo é singular; só «respondeu» um, Simão Pedro: «Tu és o Cristo, o filho do Deus vivo!».
Entre as duas respostas há um salto abismal, uma «conversão». Se antes, para responder bastava olhar ao redor e ter escutado as opiniões das pessoas, agora é preciso olhar para dentro, escutar uma voz bem diferente, que não vem da carne nem do sangue, mas do Pai que está nos céus. Pedro foi objeto de uma iluminação «do alto».
Trata-se do primeiro autêntico reconhecimento, segundo os evangelhos, da verdadeira identidade de Jesus de Nazaré. O primeiro ato público de fé em Cristo, da história! Pensemos no sulco deixado por um barco: vai se movimentando até perder-se no horizonte, mas começa com uma ponta, que é a ponta do barco. Assim acontece com a fé em Jesus Cristo. É um sulco que foi movimentando-se na história, até chegar aos «últimos confins da terra». Mas começa com uma ponta. E esta ponta é o ato de fé de Pedro: «Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo». Jesus usa outra imagem, vertical, não horizontal, vertical não horizontal: rocha, pedra. «Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha Igreja».
Jesus muda o nome de Simão, como se faz na Bíblia quando se recebe uma missão importante: chama-o de «Cefas», Rocha. A verdadeira rocha, a «pedra angular» é, e continua sendo, ele mesmo, Jesus. Mas, uma vez ressuscitado e ascendido ao céu, esta «pedra angular», ainda que presente e operante, é invisível. É necessário um sinal que a represente, que torne visível e eficaz na história este «fundamento firme» que é Cristo. E este será precisamente Pedro, e, depois dele, aquele que o substituir, o Papa, sucessor de Pedro, como cabeça do colégio dos apóstolos.
Mas voltemos à idéia da pesquisa. A pesquisa de Jesus, como vimos, desenvolve-se em dois momentos, comporta duas perguntas fundamentais: primeiro, «quem dizem os homens ser o filho do Homem?»; segundo, «quem dizeis vós que sou eu?». Jesus não parece dar muita importância ao que as pessoas pensam dele; interessa-lhe saber o que pensam seus discípulos. E o faz com esse «e vós, quem dizeis que sou eu?». Não permite que se escondam atrás das opiniões dos outros, mas quer que digam sua própria opinião.
A situação se repete, quase identicamente, nos dias de hoje. Também hoje, «as pessoas», a opinião pública, têm suas idéias sobre Jesus. Jesus está na moda. vejamos o que acontece no mundo da literatura e do espetáculo. Não passa um ano sem que saia uma novela ou um filme com a própria visão, torcida e dessacralizada, de Cristo. O caso do Código Da Vinci, de Dan Brown, foi o mais clamoroso e está tendo muitos imitadores.
Depois estão os que ficam a meio caminho. Como as pessoas de seu tempo, crêem que Jesus é «um dos profetas». Uma pessoa fascinante, que se encontra ao lado de Sócrates, Gandhi, Tolstoi. Estou certo de que Jesus não despreza estas respostas, porque se diz dele que «não apaga a chama fumegante e não quebra o caniço rachado», ou seja, sabe valorizar todo esforço honesto por parte do homem. Mas há uma resposta que não se enquadra, nem sequer na lógica humana. Gandhi ou Tolstoi nunca disseram «eu sou o caminho, a verdade e a vida», ou também «quem ama seu pai ou sua mãe mais que a mim não é digno de mim».
Com Jesus não se pode ficar na metade do caminho: ou é o que diz ser, ou é o maior louco exaltado da história. Não há meio termo. Existem edifícios e estruturas metálicas (creio que uma é a torre Eiffel de Paris) feitas de tal maneira que se se traslada certo elemento, se derruba tudo. Assim é o edifício da fé cristã, e esse ponto neurálgico é a divindade de Jesus Cristo.
Mas deixemos as respostas das pessoas e vamos aos não-crentes. Não basta crer na divindade de Cristo, é necessário também testemunhá-la. Quem o conhece e não dá testemunho dessa fé, mas a esconde, é mais responsável diante de Deus do que quem não tem essa fé. Em uma cena do drama «O pai humilhado», de Claudel, uma moça judia, linda, mas cega, aludindo ao duplo significado da luz, pergunta a seu amigo cristão: «Vós que vedes, que uso fizestes da luz?». É uma pergunta dirigida a todos nós que nos confessamos crentes.
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